Outernational

Atravesso a fronteira até à Andaluzia e a fala é cigana, arrasto o fim das palavras, como sílabas. Chego a Madrid e o espanhol acelera-se-me para acompanhar o linguajar acelerado desta cidade. Em Barcelona, tento abrir as vogais, m’agradaria molt parlar catalan mas não é fácil. Sigo em frente, chego a Paris e o meu francês é de boulevard, que eu sou chique, sou Hausmann, mas foge-me o pé para os copos em Belleville. Chego a Colónia e o meu alemão é dali e, mesmo em Berlin ou Munique, na Suíça ou na Àustria, prevalece o Hochdeutsch, coisa que não durará muito se permanecer muito tempo nesses locais. Chego a Milão ou Roma e, se me acalmar, procuro nos meus genes a fala italiana. Mas mal acelero a coisa foge-me para o espanhol. Despacito ragazzo!! Chego a Copenhaga, e além do jeg elsker deg e franske hot med suse sennup, não passo dali e voo em seguida para Inglaterra. Aí chegado encho a boca de batatas quentes, abro vogais e o inglês fica posh. Mal chego a Manchester o hooligan linguístico liberta-se, sobretudo na presença de umas pints. Aterro no Brasil e por mais que queira falar o português natal aquilo resvala e mousse de chocolate passa a moussidjechocoltajeeeee, oi tudo legau, sou de Portugau. Chego a Nova Iorque e o americano fica bubblegum.
A culpa não é minha. Nasceram-me no alto de uma serra nos confins do Alentejo com uma vista imensa para lá da planície que me abriu as vistas, me deu corda às pernas e me soltou a lingua, e não mais parei. Volta e meia regresso aí, ao gerúndio, para me acalmar e ganhar forças para mais uma volta neste carrocel linguístico.

Carlos Tomé Sousa

 

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